quinta-feira, 7 de janeiro de 2010

Ruídos de infância

Lembro-me de quando os dias tinham o gosto bom do suco de hortelã que minha madrinha fazia pra mim.
Eu respirava a vida e meus cachos caiam por meus ombros desnudos: cintilante inocência.
Lembro dos olhos brilhantes e negros do meu pai, seu rosto corado pelas tardes: estende-se a alma na lembrança de traços tão finos e belos que enalteciam meu coração.
O cheiro dos bolos que ele fazia em minhas datas natalícias, a brisa doce dos sonhos de creme que povoavam meu imaginário pueril de alegria transbordante.
Cinco anos, cinco destinos (que se reduziram fatalmente em pedra no chão), os cabelos dourados da mãe, a calvície terna do pai sorrindo; ambos vestiam sempre a cor branca (a mãe enfermeira, o pai confeiteiro). Um branco tão altivo, para zombar de mim, anunciando a paz que jamais me acompanharia no decorrer da vida voraz...
Minha vida iria escolher o vermelho-sangue como cor matriz de sua trajetória. E mais tarde nos braços cretinos dos homens, viria descobrir que mesmo esse vermelho desbotara. Me condenando a esse rosa (que beira o ridículo) dos sonhos que nunca tive. Esse rosa do batom que eu nunca usei, esse rosa irritante, das flores que ninguém jamais me mandou.


(em algum dia de 2008).

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